O Papa Francisco, em 8 de janeiro de 2024, incentivou a proibição da gestação por barriga de aluguel. Para ele, a “maternidade de aluguel” tratar-se-ia de uma comercialização do corpo da mulher, afirmando, ainda, que “o caminho para a paz exige respeito pela vida, por toda a vida humana, a começar pela criança que não nasce no ventre materno, que não pode ser suprimida nem transformada em produto comercial”. O Pontífice considera “deplorável” essa prática porque ela, em sua opinião, “ofende gravemente a dignidade das mulheres e das crianças”.
Esta visão mais conservadora da situação não é, todavia, unânime, mormente para muitas mulheres, as quais, infelizmente, só conseguem realizar o grande sonho de serem mães quando seu filho puder ser gerado no ventre de outra mulher, ou seja, por meio da barriga de aluguel.
Também mundo afora, as legislações sobre o tema divergem. “Nos Estados Unidos, por exemplo, onde a saúde é um bem que pode ser comercializado, há a possibilidade da “barriga de aluguel”, bem como a compra de gametas, escolha de características fenotípicas e sexagem. Na Califórnia, é possível, ao escolher o gameta masculino, ouvir a voz do doador, saber o QI dele, escolher a cor dos olhos, etc. É um mercado como qualquer outro. Na Europa também há uma maleabilidade maior. Na Dinamarca, por exemplo, há uma naturalidade de exclusão de bebês com síndrome de Down”, explica Luciana Munhoz, advogada especialista em Biodireito.
Em solo nacional, a coisa muda de figura. Embora não haja legislação específica sobre esse tema, dificultando, na prática, quem busca uma alternativa para realizar o grande sonho da maternidade. O que existe escrito sobre o assunto está previsto na Resolução 2.168/2017 do Conselho Federal de Medicina e, de forma geral, dispõe que a Gestação de Substituição ou a Cessão de Útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.
O item VII de referida Resolução dispõe que “as clínicas, centros ou serviços de reprodução assistida podem usar técnicas de Reprodução Assistida para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética, em união homoafetiva ou pessoa solteira”. Há previsão, ainda, exigindo que “a cedente temporária do útero deve pertencer à família de um dos parceiros em parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau – mãe/filha; segundo grau – avó/irmã; terceiro grau – tia/sobrinha; quarto grau – prima). Demais casos estão sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina”, isto é, tratar-se-ia de ato voluntário e por altruísmo de um familiar. Daí o termo Barriga Solidária, como o procedimento é conhecido popularmente.
Neste cenário, temos que a Barriga Solidária atinge o objetivo da maternidade para os casos em que a gestação não pode ocorrer no útero da futura mãe biológica, sem haver a comercialização do útero, estando, assim, em consonância com a orientação do Papa Francisco e com a orientação brasileira prevista na Resolução do CRM acima mencionada. Todavia, esse entendimento não agrada a todos. A advogada Maria Berenice Dias, especialista em Direito de Família, afirma ser a “favor da permissão da prática da “barriga de aluguel”, já que a pessoa que cede a barriga vai ser submetida a um procedimento com risco de vida, além de uma situação repleta de restrições que a gestação implica. Não há motivo para não ser uma prática remunerada, como é em vários países do mundo. Trata-se de um preconceito conservador”.
Muitas são as dúvidas e os questionamentos sobre o tema e, tendo em vista a falta de legislação específica sobre ele, tudo fica ainda mais complicado, seja sob o aspecto prático, seja sob o aspecto teórico e legal. De todo modo, e para evitar maiores problemas, os especialistas recomendam que sejam observadas as determinações do Conselho Regional de Medicina para que se possa ter o mínimo de garantia legal. Recomenda-se, assim, que as partes envolvidas assinem um Termo de Consentimento para que nele estejam estampadas as manifestações das vontades dos envolvidos e as regras do jogo. E, ainda, recomenda-se que haja o acompanhamento jurídico feito por advogados especialistas na área.
Em caso de dúvidas, colocamo-nos à disposição para eventuais esclarecimentos complementares que desejarem ou necessitarem.
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Fontes: Migalhas, Resolução 2.168/2017 do Conselho Federal de Medicina, Adefaz e Atas de Jornadas Internacionais “Igualdade e Responsabilidade nas Relações Familiares”.